No dia 29 de junho lembramos o martírio de Pedro e de Paulo.
Os dois seguiram caminhos diferentes por toda a vida. Um foi pescador e saiu
pescado. O outro, um intelectual, cidadão romano, que entrou no movimento pela
porta dos inimigos e se tornou seu comandante.
Pedro era um cara simples, que não se envergonhava de suas
lacunas. Era sarcástico e afeito a frases curtas. Foi o discípulo amado, que
jurou fidelidade eterna. Mas, traiu o Mestre e foi capaz de chorar por isso. Um
de nós, com todas aquelas falhas de caráter que tanto detestamos, porque nos
tornam fracos. Ainda assim, foi elevado ao posto de pedra angular da Igreja. O
pescador Simão virou Pedro, para ser apóstolo. Jesus lhe deu o novo nome, para
ser a “rocha” sobre a qual ergueria seu Reino.
Tornou-se o apóstolo da esperança cristã, porque assume suas
fraquezas. Seu título apostólico é “Pastoreia as minhas ovelhas”. Que se calem
os “pastores” midiáticos dos nossos dias, diante do sucesso de Pedro. Seu
primeiro discurso juntou três mil batizados ao grupelho dos doze! Poucos dias
depois, outros cinco mil entraram na de Jesus. É mole ou quer mais? Seu sucesso
incomodava Roma, e ele já era o chefe daquela igreja que crescia como fermento
na massa.
Portanto, esquece aquela história boba de chefe do tempo,
que fica mexendo na torneirinha e soprando nuvens pelos céus. As chaves que
Pedro recebeu são de outra verve. Abrem muito mais portas do que imagina nossa
tola religiosidade viciada pelas divindades que dominavam as cabeças do cidadão
comum do antigo império dos césares. Foi por causa do poder dessas chaves que
Nero resolveu trancafiá-lo atrás das grades.
Saulo era diferente. Um jovem rico e fanático, de direita,
que vestia a camisa do império com orgulho, entrou de cabeça na caça aos
extremistas seguidores daquele crucificado que se dizia rei. Exterminar aquele
bando de pés rapados de esquerda era a missão que assumiu como sua. Convicto,
ajudou a apedrejar Estevão. Perseguiu essa gente até Damasco, na Síria. O
cidadão romano ligado às milícias do império era aluno dedicado dos escribas e
fariseus. Sonhava em ser rabino.
Que me perdoem os que se dizem “convertidos”, mas se tem
alguém que pode falar de uma verdadeira conversão, é Saulo! Na senda da
perseguição para Damasco, Saulo caiu do cavalo. Em vez dos miseráveis pés
rapados que perseguia, deu de cara com o próprio chefe do bando, que o cegou
com uma luz tão branca como o laser. “Saulo, por que você me persegue?”. Um
encontro de tirar o fôlego e a visão! Uma luz tão clara que ilumina um caminho
completamente novo. Aos 30 anos, o jovem “coxinha" transforma-se em
“mortadela”. É tão radical que Saulo vira Paulo. Seguem-se outros 30 anos de
fanática dedicação à causa que outrora perseguia. Ali, aos 30, nasce uma nova
personalidade, tão arrebatadora e radical quanto a que morria naquela luz
ofuscante.
Agora Paulo, ele não se intimidou com o ódio sincero que os
judeus passaram a dedicar-lhe. Viajou pelo mundo espalhando a doutrina
proscrita. Enfrentou aventuras dignas de Moby Dick para falar de Cristo.
Enquanto Pedro segurava as pontas com os judeus convertidos, Paulo tornou-se o
“apóstolo dos gentios”. De uma seita judaica dissidente, com Paulo, a
incipiente igreja iniciada por Pedro teve que escancarar suas portas. Paulo, o
fundador do ecumenismo, não titubeou nem diante da estátua ao “deus
desconhecido”. Um gênio da homilética missionária, soube como ninguém converter
momentos de puro embaraço em oportunidades de pregação. Intelectual de amplo
conhecimento, as principais formulações da primeira teologia cristã saíram de
sua espetacular verve de escritor. De pena fácil e agilidade mental genial, seu
legado ainda faz ferver as mentes dos grandes teólogos dois mil anos depois.
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Pedro, o simplório, e Paulo, o teólogo, fizeram a Igreja de
Cristo prosperar. Não sem razão são chamados de príncipes dos apóstolos. Os
caminhos tão diversos desses dois – na maioria das vezes mais divergentes do
que diversos – uniram-se no final. Presos em Roma, foram executados no mesmo
dia pelo imperador Nero. Diz a tradição da igreja ortodoxa que isso aconteceu
no dia 29 de junho, em Roma.
Lenda ou verdade, o dia 29 de junho é um chamado à missão. E
isso significa que não guardamos o tesouro da fé a sete chaves dentro do peito,
mas o espalhamos com vigor e determinação. Como Pedro. Como Paulo. Como eles,
todos e todas nós somos apóstolos e apóstolas; ou seja, enviados e enviadas. A
palavra apóstolo, em seu sentido original, significa “alguém que vai na
frente”, com uma mensagem. Assim, somos carteiros e carteiras do Evangelho.