quarta-feira, 28 de setembro de 2011

As peles da sua cebola

Nas Peles da Cebola conseguiu causar uma revolução na vida do escritor octogenário que resolveu contar ao mundo a sua juventude. Trata-se de Günther Grass, escritor alemão prêmio Nobel de literatura por sua obra prima O Tambor. Nas Peles da Cebola custou muitas explicações a Grass, por revelar que aos 17 anos se alistou como voluntário e lutou no front por amor ao Führer. Não entenderam o seu gesto juvenil, embora ele tenha condenado o Nazismo em todas as suas obras, nesta inclusive.

O que me leva a citar Günther Grass é a imagem de uma cebola sendo despelada. A nossa memória, que é descrita por ele como uma gigantesca lata de lixo que acumula qualquer coisa na mais absoluta bagunça, é como uma cebola. Mexer na memória é como remover as camadas dessa cebola, pele após pele, enquanto nos vão sendo reveladas lembranças alegres e tristes e se pode até chorar. Às vezes, as recordações ardem (a revelação de Grass ardeu um monte). Outras vezes, a pele não revela nada, porque a memória insiste em reter o que queremos lembrar.

Cada um de nós recebe uma cebola na vida. Nela é gravado tudo o que experimenta. Fica registrado aquilo que podemos revelar com alegria e satisfação. Mas também fica marcado ali – às vezes de maneira ainda mais profunda do que as coisas boas – tudo aquilo que gostaríamos de esquecer, de apagar ou de tornar nulo.

Imagino que também você tenha muitas coisas sendo reveladas pelas peles da sua cebola. Talvez as peles da sua cebola já registram o casamento, o nascimento dos filhos, os amigos que granjeou ao longo da vida. Mas também pode ter nas peles de sua cebola o casamento fracassado, a separação, a perda de alguém querido, uma frustração ou mesmo erros cometidos.

Com o passar do tempo, algumas camadas da cebola da nossa vida se negam a revelar alguma coisa que até gostaríamos de relembrar. Parece que algumas peles de cebola são falhadas e não registram bem o que aconteceu. Mas eu venho percebendo que, quanto mais velho se fica, mais fuça na cebola e mais ela acaba revelando.

Mas, assim como Gunter Grass, também nós devemos aprender a lidar bem com as lembranças que às vezes carregamos como um fardo. Coisas que fizemos ao longo da vida e das quais não nos orgulhamos tanto assim. A melhor maneira de ajudar nossa cebola a lidar com coisas assim é revelar, abrir o jogo, confessar a Deus e ao próximo. Isso nos traz alívio e vida renovada. Foi também a maneira, bastante dolorosa, que o autor de Nas Peles da Cebola encontrou para reconquistar paz de espírito em relação ao seu passado mais remoto.

Para encerrar, leia Eclesiastes 3.1-12. Ele nos desafia a, de vez em quando, despelar um pedaço da cebola de nossas vidas. É um exercício em que a gente descobre quantas coisas Deus tem feito por nós, e quão ricas são as suas obras. Ele de fato nos conduz, nos fortalece, e nos ensina com tudo o que acontece em nossa vida. Despelar a cebola da vida é principalmente um exercício de gratidão pelo que temos sido e vivido.

Quando ficamos muito tempo longe da cebola da nossa vida, esquecemos o seu aroma e nos tornamos pessoas ingratas e insatisfeitas. Não avaliamos corretamente tudo o que temos recebido de bênçãos e, principalmente, esquecemos que tudo tem o seu tempo determinado.

Este é um problema especialmente na idade produtiva, um tempo de pensar no sustento, na educação dos filhos, em juntar bens e criar uma base sólida para edificar o futuro. Dê uma olhada na cebola da sua vida, compartilhe as experiências importantes com o(s) seu(s) filho(s). Todos se enriquecem com isso e nós nos tornamos agradecidos.